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O cliente no centro do negócio: Uma jornada de transformação

Atualizado: 7 de jun. de 2022

Parte 01 | Escrito em 22 de agosto de 2021, por Leonardo Araújo. Colocar o cliente no centro do negócio vai muito além dos discursos motivacionais que animam as convenções de vendas, das frases de impacto que colorem as paredes corporativas ou dos programas de excelência no atendimento. É uma jornada de transformação que envolve todas as áreas da empresa, sem exceção, com o objetivo de refinar a cultura (criar senso de cliente), engajar pessoas e mudar os processos, em favor da entrega de soluções completas aos clientes. Neste artigo vamos conhecer as 3 primeiras premissas desse processo, boa leitura!





Em seu livro “Management: Tasks, Responsabilities, Practices” (1973), Peter Drucker aborda o propósito e os objetivos de um negócio: “Para saber o que é um negócio, temos que começar pelo seu propósito. Seu propósito deve residir fora do próprio negócio. [...] Existe apenas uma definição válida de propósito de negócio: criar um cliente”. De lá para cá, muita coisa mudou no mundo dos negócios e o preceito de Drucker ganhou força. O cliente não só continua no epicentro, como teve seu poder ampliado exponencialmente com a transformação digital. Clientes em rede e conectados 24 x 7, exercem, como nunca, o poder do acesso a informações, da influência social e da escolha.


Apesar disso, o tema customer centricity (centralidade no cliente, CC) ainda é tratado de forma superficial em muitas empresas. Colocar o cliente no centro do negócio vai muito além dos discursos motivacionais que animam as convenções de vendas, das frases de impacto que colorem as paredes corporativas ou dos programas de excelência no atendimento. É uma jornada de transformação que envolve todas as áreas da empresa, sem exceção, com o objetivo de refinar a cultura (criar senso de cliente), engajar pessoas e mudar os processos, em favor da entrega de soluções completas aos clientes.


UM NOVO MINDSET: PENSANDO O NEGÓCIO DE FORA PARA DENTRO

A CC é um processo transversal e contínuo de mudanças. Muitas empresas ficam pelo caminho nesse trajeto. Mas por que isso acontece? Justamente porque partem de uma visão fragmentada e decidem investir em projetos que vão resolver apenas problemas pontuais. É como completar, com máxima eficiência, uma parte de um grande quebra-cabeças, mas sem encontrar e encaixar várias peças para completar outras partes. Da mesma forma, no campo da gestão, a CC perde força quando faltam iniciativas de integração para estimular a autonomia e a cooperação entre áreas, com objetivo de servir melhor os clientes.


A metáfora do quebra-cabeças nos ajuda a entender um dilema muito comum nas empresas: a armadilha da excelência interna. Explico. As empresas crescem, tornam-se complexas. Daí, os gestores partem em busca da excelência na gestão de processos e produtos. O lema é garantir alta performance. O problema é que acabam não alcançando uma visão panorâmica sobre como garantir a entrega de experiências singulares aos clientes. Silos de excelência não formam uma empresa excelente em servir o cliente. A soma das partes é menor que o todo. No livro “Seis Regras Simples” (2015), os autores Yves Morieux e Peter Pollman afirmam: “A verdadeira praga não é a complexidade em si, mas a ‘complicação’, que definimos como como a proliferação de mecanismos organizacionais desajeitados – estruturas, procedimentos, regras e papéis que as empresas colocam em prática em um esforço para lidar com a crescente complexidade da empresa moderna”. E quanto maior a “complicação” interna, menos a empresa olha para fora.


Para se tornar centrada no cliente, a empresa precisa seguir um rumo certeiro: evoluir do viés estreito de produto, para o viés de cliente (necessidades e expectativas a serem atendidas). É sobre pensar o negócio de fora para dentro. Quando Drucker nos lembra que o “propósito deve residir fora do próprio negócio”, ele reforça essa perspectiva. Trata-se, então, de mudar o foco e o centro de gravidade do negócio: de produto para cliente.


Essa guinada faz todo o sentido. Em mercados maduros, com tecnologia acessível por todas as empresas, a vantagem competitiva focada apenas em diferenciais de produto é passageira. Concorrentes são ágeis em replicá-las. Significa dizer que a vantagem sustentável será cada vez mais baseada no conhecimento profundo que a empresa tem sobre o mundo do cliente - feito de percepções, experiências e relacionamentos. Sensibilidade para entender esse mundo e ser competente para criar soluções inovadoras é o grande diferencial das empresas centradas no cliente.


PREMISSAS ESSENCIAIS DA CENTRALIDADE NO CLIENTE

Para gestores e empreendedores que querem refinar conceitos e aprimorar práticas nesse tema, vou explorar as sete premissas essenciais da centralidade no cliente. Elas devem orientar objetivos, iniciativas estratégicas e projetos nas empresas que buscam colocar o cliente no centro do negócio . É bom lembrar que a CC não é um projeto, mas uma jornada que envolve todas as áreas da empresa. Assim, o principal patrocinador deve ser o CEO. Ele tem de ser o campeão da causa. Deve estimular o engajamento das lideranças e equipes para garantir que as iniciativas de transformação da cultura e dos processos virem realidade. Essa é a “premissa zero” da centralidade no cliente.


PREMISSA 1 – GUIAR A ESTRATÉGIA DO NEGÓCIO

A CC é um vetor estratégico da empresa. Deve ser refletida na missão e nos valores corporativos. É o ponto de partida para o desenvolvimento da cultura de cliente que vai influenciar a operação do negócio. Um caso emblemático é o da Amazon. A CC é declarada de forma direta na missão da empresa: We aim to be Earth’s most customer centric company”. Para fortalecer sua missão, um dos princípios de liderança é “obsessão pelo cliente”: Leaders start with the customer and work backwards.


Ao fundar a Amazon, Jeff Bezos concebeu um modelo operacional em que a experiência do cliente e preços atraentes seriam as engrenagens para o crescimento do negócio. Como funciona esse modelo? É um círculo virtuoso. Tudo começa com uma forte cultura de experiência do cliente. Boas experiências aumentam o tráfego na Amazon.com. e os vendedores de produtos são atraídos para a plataforma. Isso gera um aumento do mix de produtos e das vendas. Por sua vez, vendas em alta geram escala e ganhos de produtividade, permitindo redução de preços. Uma combinação perfeita: experiências elevadas com preços reduzidos.


O caso Amazon traz boas questões sobre CC. A principal é essa: o cliente está, de fato, no centro do nosso negócio? O primeiro passo para avançar na CC é ir além do senso comum que diz: “todo negócio tem que ser voltado para o cliente”. Ninguém nega essa obviedade! Sem clientes não há negócio. O grande desafio é como modelar o negócio para obter o melhor retorno com cada cliente! E como a estratégia empresarial deve viabilizar a CC e garantir esse retorno?


Um caminho efetivo para alcançar a CC é através da resiliência organizacional. Empresas resilientes são capazes de mudar cultura e processos para entregarem soluções completas aos clientes. Elas encaram uma densa jornada de transformação. Em seu livro seminal sobre customer centricity, “R(e) (Organize) For Resilience: Putting Customers at The Center of Your Business”, o Prof. Ranjay Gulati explora níveis de resiliência organizacional, partindo da “alta rigidez” (zero resiliência), até o nível de “alta resiliência”, onde a empresa se “(re)organiza” em função dos problemas que os clientes querem resolver, e parte para oferecer soluções completas.


O livro é fruto de uma longa pesquisa. Gulati estudou empresas de diferentes setores e identificou cinco alavancas (“levers”) que tornam as empresas mais resilientes:

1 - Coordenação: alinhamento de atividades, processos e informações entre os setores da empresa;

2 – Cooperação: alinhamento de objetivos, atitudes e comportamentos entre os setores da empresa;

3 – Influência: atribuição de poder às equipes voltadas para o cliente e aos responsáveis pela integração de atividades;

4 – Capacidades: Desenvolvimento de generalistas voltados para o cliente, agindo em conjunto com especialistas em produto;

5 – Conexões: alianças externas que a empresa pode desenvolver, visando expandir suas fronteiras funcionais para resolver problemas do cliente.


Como anda a resiliência da sua empresa? Essa é uma boa questão para próxima revisão do planejamento estratégico. Se a estratégia do negócio não conter objetivos e iniciativas na direção da resiliência organizacional, a empresa continuará focando o seu desempenho com um viés estreito na gestão de indicadores de produtos e de processos, reforçando a cultura “de dentro para fora”. As cinco alavancas abordadas no livro representam um bom roteiro para um diagnóstico amplo da CC.


PREMISSA 2 – ALAVANCAR O VALOR DO NEGÓCIO

Quanto vale um cliente? Quando vale o nosso negócio? Essas questões são cruciais para qualquer empresa. Elas reforçam a segunda premissa: colocar o cliente no centro do negócio é uma estratégia para aumentar a avaliação (valuation) da empresa. Afinal, não tem sentido empreender uma jornada de transformação cultural e de processos na empresa, com foco na CC, se isso não impactar positivamente o fluxo de caixa. Nesse sentido, o grande desafio é encontrar o caminho que maximize a geração de valor, tanto para o cliente quanto para a empresa.


Como avançar nessa direção? O primeiro passo é romper com a visão míope de que a CC gera benesses que prejudicam a margem do negócio. Trata-se de um engano ingênuo. Princípios básicos sobre formulação de uma proposta de valor nos ensinam que a percepção de benefícios (tangíveis e intangíveis) pelo cliente tende a aumentar a propensão a pagar. É claro que essa lógica prevalece quando a empresa é capaz de agregar benefícios que sejam relevantes para o cliente. Em outras palavras: é preciso entender muito bem de cliente para gerar valor para a empresa. Essa perspectiva reforça uma das teses do excelente livro "The Three Tensions: Winning the Struggle to Perform Without Compromisse" (2007), escrito pelos consultores Dominic Dodd e Ken Favaro. O livro trata de três tensões que rondam qualquer negócio e tiram o sono de altos executivos:


1- Lucratividade versus Crescimento de Receitas;

2 - Curto Prazo (resultado hoje) versus Longo Prazo (resultados amanhã);

3 - O Todo (performance da empresa como um todo) versus As Partes (performance de cada parte da empresa);


Aqui nos interessa abordar a primeira tensão. O problema não é tornar-se mais lucrativo ou encontrar novo crescimento de receitas. O desafio é obter ambos ao mesmo tempo. Como vencer esse desafio? Segundos os autores, o segredo é preservar e reforçar o benefício ao cliente. Eles afirmam: Se a gestão de receitas e de custos está direcionada para alavancar o benefício ao cliente, lucratividade e crescimento podem coexistir. O benefício ao cliente é algo diferente do que o produto ou serviço é ou pode fazer. É o prêmio que o cliente recebe por sua experiência em escolher e usar o produto ou serviço. O grande problema é que a coexistência de lucratividade e crescimento nem sempre é uma realidade. Por que? Justamente porque é muito difícil para os gestores romper com esse círculo vicioso: ora são pressionados para alavancar o crescimento das vendas e perdem o controle sobre os custos, sacrificando as margens; ora precisam alavancar as margens, e acabam dedicando menos esforços para aumentar receitas. A diretriz da CC de aumentar o valor do negócio deve ajudar os gestores a quebrar esse o círculo vicioso.


Um caminho de avanço é ter uma gestão de custos sem miopias ou imediatismos, para não ferir o benefício ao cliente. Os autores Dodd e Favaro argumentam que os gestores precisam distinguir bem os chamados custos bons (“good costs”) dos custos ruins (“bad costs”). Custos bons são aqueles necessários para produzir benefício ao cliente. Custos ruins, por sua vez, não geram qualquer benefício (por exemplo, realizar atividades não necessárias para alavancar a experiência do cliente). Quando há uma forte cultura de CC, os custos bons são sempre preservados, mesmo nos períodos de restrições orçamentárias. A abordagem sobre valor do cliente e valor do negócio ressalta a importância da gestão de clientes sob a ótica financeira. De acordo com diretrizes da CC, os investimentos em marketing canalizados para relacionamento (customer success) devem alavancar o valor financeiro de cada cliente. Assim, a equação de valor do negócio será turbinada pelo aumento do CLV – customer lifetime value (valor do ciclo de vida do cliente em seu relacionamento com a empresa).


É fato: a vantagem competitiva sustentável depende mais da competência da empresa no relacionamento com clientes e menos do conhecimento de produtos. Por isso, a CC deve incorporar na agenda do marketing métricas voltadas para o valor de cliente: lucratividade, margem, custo e taxa de aquisição, custo e taxa de retenção. Nas empresas customer-centric, o marketing de resultados vai muito além da satisfação do cliente.


PREMISSA 3 – MODELAR A GESTÃO DA EXPERIÊNCIA DO CLIENTE.

Experiência do cliente é o tema da hora! Está presente na agenda estratégica das empresas. É assunto frequente na timeline das redes sociais. Cada vez mais, a vantagem competitiva depende da entrega de experiências positivas aos clientes. Em 2015, uma pesquisa da consultoria Gartner revelou que, em 2016, 89% das empresas esperavam competir principalmente com base na experiência do cliente, contra 36% quatro anos atrás. É bem provável que esta expectativa continua em nível bastante elevado.


Voltando alguns anos na linha do tempo, vamos encontrar alguns livros com abordagens diversas sobre o tema customer experience (CX), mas com conceitos convergentes. Em 1999, no livro The Experience Economy: work is theatre & every business a stage, os autores B. Joseph Pine e James H. Gilmore exploraram o conceito “progressão do valor econômico”: “extract commodities” >> “make goods” >> “deliver services” >> “stage experiences”. Eles mostraram como as empresas podem criar diferenciação e capturar maior valor (via premium price) a partir da entrega de experiências extraordinárias. Negócios como Disney e Starbucks ilustram bem essa abordagem.


Outros livros foram lançados nos anos seguintes e são referências para quem deseja explorar o primeiro marco conceitual sobre o tema CX: “Building Great Customer Experiences” (2002), escrito por Colin Shaw e John Ivens; “Customer Experiences Management: A revolutionary approach to connecting with your customers” (2003), de Bernd H. Schmitt; “Clue In: How to keep customer coming back again and again” (2004), de Lewis P. Carbone. Alguns livros mais recentes ampliam os conceitos sobre CX: "Outside In: The power of Putting Customer at the center of your business" (2012), de Harley Manning e Kerry Bondine; "Customer Experience 3.0: High-Profit strategies in the age age of techno service" (2014), de John Goodman; "Customer Experience: 22 internacional CX professionals share their current best-thinking on achieving impact and visibility through worldclass, best-practice CX" (2019);


Ao abordar o tema CX, é preciso reforçar essa premissa: as iniciativas de CX estão vinculadas à estratégia de CC e devem ser fortalecidas por ela. Em outras palavras, quanto mais consistente for a centralidade no cliente, mais a empresa será capaz de criar e entregar experiências positivas. Quando os gestores conseguem enxergar e praticar a convergência sinérgica entre CC e CX, não correm o risco de caírem na cilada do grande quebra-cabeças incompleto.


No livro “Customer Centricity: Why it is critical to your business and how to measure it” (2016), o autor Gareth Evans explora muito bem a convergência entre CC e CX: “Ser centrado no cliente é a única maneira de oferecer uma experiência aprimorada ao cliente e construir uma vantagem competitiva sustentável”. O livro detalha um “modelo operacional de experiência do cliente” que contempla alguns aspectos que já destaquei: o papel crucial da cultura como ponto de partida para a empresa fortalecer a centralidade no cliente e a importância de processos bem estruturados para garantir a entrega de experiências.


Ao definir customer experience, Evans se apoia em vários autores para nos lembrar que se trata de [...” uma resposta emocional do cliente em relação às suas expectativas serem ou não atendidas...”]. Essa definição é um alerta para muitos gestores que ainda insistem em analisar e reagir à experiência do cliente com uma visão muito cartesiana. O mundo do cliente é bem diferente do mundo da empresa. Por isso, o cliente não está interessado em indicadores de qualidade de processos (ex: six sigma) e em outros índices de desempenho que pertencem ao mundo da empresa.


Seguindo sua linha de raciocínio, Evans traz a definição de customer centricity elaborada por Peter Fader, autor do livro "Customer Centricity: Focus on Right Customers for Strategic Advantage" (2012): “É uma estratégia para alinhar fundamentalmente os produtos e serviços da empresa com os desejos e necessidades de seus clientes mais valiosos. Essa estratégia tem um objetivo específico: obter mais lucros a longo prazo.” O alinhamento proposto nessa definição reitera a importância da perspectiva de se pensar o negócio de fora para dentro, um dos preceitos centrais da CC. A definição também reforça a ideia de que CC deve alavancar o valor financeiro do negócio. Está claro que a boa gestão da experiência do cliente é fator crítico de sucesso para qualquer negócio. Vou reforçar aqui quatro contextos dessa gestão que devem ser observados pelos gestores para ajudar a empresa a ser cada vez mais centrada no cliente:


1 – Contexto Sensorial: Seja na dimensão física ou digital, o design criativo e prático dos produtos e serviços será sempre uma via de prazer, conforto ou comodidade para os clientes. Como já disse Steve Jobs, “Design é função, não forma”.


2 – Contexto Operacional: Pessoas engajadas, bem treinadas e com autonomia para agir devem executar processos simples e flexíveis, contando com o apoio de sistemas inteligentes, desenvolvidos para facilitar a vida dos clientes. Essa frase pode parecer um tanto teórica. Afinal, todos nós, como clientes, costumamos enfrentar percalços por aí. Mas é assim que deve funcionar a operação de uma empresa com o DNA da CC. Operações redondas são sinônimo de conveniência para o cliente.


3 – Contexto de Interatividade: Na prática, funciona assim: prover acesso contínuo a informações que economizam tempo e esforços, ter abertura ao diálogo permanente nas redes sociais, engajar clientes com storytelling transparente, reforçar o propósito da marca, prover serviço de customer care sensível e resolutivo (para anular o customer stress). Interatividade é isso. O cliente agradece.


4- Contexto de Cocriação de Valor: No grande bazar digital, a liberdade de escolher uma gama enorme de ofertas padronizadas evoluiu para a liberdade de criar, montar produtos, combinar atributos. O cliente define o “que-como-onde” pode “comprar-pagar-receber-usar”. Clientes querem co-criar valor com as empresas. Quem não se preparar para “montar um lego com o cliente”, estará fora do jogo. Essa metáfora é um alerta para quem quer competir melhor.


Vamos seguir essa leitura no próximo artigo?





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